Tenho refletido muito ultimamente sobre o fato de eu ser excessivamente otimista e de bem com a vida, raramente sentindo raiva, tristeza e frustração. Mesmo a ansiedade, tão presente em quem passa por momentos tão difíceis como o que estamos passando, tende a não sair do meu controle e se tornar disfuncional.
Isso tudo pode aparentar ser muito positivo, mas comecei a achar que nem sempre esse é o caso. Em retrospectiva, entendo que em vários momentos da minha vida eu deveria ter tido uma posição mais enfática e ter prestado mais atenção às emoções negativas que chegavam a mim.
Comecei a achar que realmente um esporro na equipe ou no filho pode sim ter um papel positivo de vez em quando e que isso não significa que eu seja mau ou desrespeitoso. Comecei a entender que o medo de que algo ruim aconteça é um super indutor de atitudes para prevenir e resolver as ameaças.
Ficou claro para mim que precisamos nos sentir mais confortáveis com sensações e emoções desconfortáveis e que, na verdade, precisamos encarar as emoções como úteis ou inúteis e não como positivas ou negativas, afinal de contas todas as emoções são informações que estamos recebendo.
Emoções positivas em excesso e sem limites podem ser prejudiciais para a gente. As emoções negativas existem por uma razão evolucionária, são subsídios que recebemos para sair da inércia e para agir frente a situações potencialmente ruins.
O problema é que existe hoje em dia uma ditadura das emoções positivas, uma verdadeira corrida do ouro, uma busca desenfreada pela felicidade e uma fuga a qualquer custo de qualquer emoção negativa.
Isso acontece também porque as emoções negativas são relacionadas a um alto custo social, tidas como desagradáveis e associadas à perda do autocontrole e ninguém quer fazer parte dessa turma, por isso reprimimos ou evitamos elas.
Mas o fato irrefutável é que não temos como fugir das dores da vida. Isso é irreal e essa tentativa só vai nos trazer mais dor. Em vez de evitar o sofrimento, devemos aceita-lo como parte da vida. Até porque os estados psicológicos, bons ou ruins, são passageiros, e não permanentes, e sempre iremos alternar entre ambos. Além disso, evitar os problemas faz com que não encontremos soluções para eles.
De um lado, precisamos das emoções negativas para crescer, adquirir maturidade e ter uma vida plena. De outro lado, subestimamos nossa capacidade de lidar e reagir a situações difíceis e incômodas.
Também contribui para a nossa incapacidade de lidar com emoções negativas o fato de termos dado muita ênfase e nos tornado viciados em conforto nas últimas décadas, o que afeta nossa capacidade de lidar com dificuldades e nos torna mais impacientes para lidar com problemas. É só lembrar o nível de dificuldades e desconforto com os quais lidavam os nossos antepassados para verificar como nos tornamos muito mais sensíveis às agruras da vida.
As emoções negativas têm a vantagem adicional de nos fazer focar na situação, enquanto as emoções positivas nos deixar relaxados e até desatentos. É aquela história, se você vai bater num prego com um martelo você precisa focar no que está fazendo. Você não enxerga, nem vê mais nada. E quem nos dá esse foco é o medo.
As emoções negativas podem ser um potenciador de coragem (raiva), um comportamento que mantém a ética nos trilhos (culpa) e um vigilante sempre alerta ao seu lado (ansiedade).
É óbvio que queremos sentir medo em uma situação de perigo, raiva para defender uma pessoa amada, e arrependimento por não ter feito algo que deveria ter sido feito e com isso não falhar novamente no futuro.
Em diversos momentos as emoções negativas são sinais de que algo não vai bem e exige sua atenção imediata.
A raiva é uma das emoções negativas que pode ser utilizadas a nosso favor. Raramente a raiva é tão grande a ponto de nos levar a perder o controle e gerar uma espiral de violência. Na grande maioria das vezes ela pode ser uma aliada, pois a tendência é a raiva surgir quando você percebe uma violação dos seus direitos enquanto pessoa, fazendo você se defender, defender as pessoas que lhe são caras e ou manter limites saudáveis com outras pessoas e situações.
Certamente o mundo não seria o que é hoje sem a raiva contra as injustiças que inspiraram tanta evolução, mudanças e resultados positivos. Algumas vezes é importante extravasar e dar um esporro, seja um técnico em um time que está perdendo, seja um executivo em sua equipe, seja uma mãe com seu filho. Existem momento que é importante chacoalhar as coisas.
Em geral, a raiva surge quando acreditamos que fomos tratados injustamente, ou que algo está bloqueando nossa capacidade de alcançar objetivos significativos, mas ela funciona bem também nas negociações. Diante da raiva, as pessoas têm muito menos propensão a fazer exigências e expressa-la leva a negociações mais bem-sucedida. Pessoas com raiva têm um status maior nas negociações, ao contrário das pessoas boazinhas, infelizmente.
Outra emoção geralmente tida como negativa e muito presente em nossas vidas é a ansiedade. Nos últimos tempos tenho encarando-a de outra maneira e aproveitado bastante ela. Simplesmente entendi que a ansiedade é um verdadeiro sistema de alarme humano. Sempre que estou ansioso em relação a algo lembro que isso é um aviso da vida para eu fazer algo a respeito. Desde que mudei a minha perspectiva, passei a tratar a ansiedade mais como aliada do que inimiga.
Não é fácil e preferiria não ter que sentir, mas ficou claro para mim que o problema não está na ansiedade, mas na maneira de encara-la. Por outro lado, as pessoas não ansiosas têm uma tendência maior a ignorar os sinais de um perigo em potencial e isso sim é muito negativo e pode causar danos reais a nós. Isso acontece muito com pessoas que tomam remédios contra depressão e depois de um tempo acabam vendo a vida excessivamente colorida.
Ser ansioso pode trazer vários benefícios, com as pessoas ficando atentas a problemas potenciais, especialmente em situações novas ou ambíguas, reagindo com maior rapidez à presença de perigo e gastando mais energia na resolução dos problemas.
Claro que ansiedade demais é prejudicial. Tudo tem que ser dosado, inclusive baixos níveis de ansiedade, que nos deixa acomodados, sem estímulos e energia para nos mover e realizar coisas.
Também é muito difícil imaginar a gente vivendo em mundo sem culpa, até porque ela não é tão horrível quanto se imagina. A culpa é, na verdade, um sinal de que você está violando seu próprio código moral e, portanto, precisa modificar suas ações ou o seu código.
Pessoas que sentem culpa querem aprender com seus erros e são motivadas a melhorar, com a culpa sendo frequentemente um sinal de que cometemos um pequeno erro e precisam ajustar a situação.
Já a vergonha é diferente. Quando sentimos vergonha, não nos contentamos em achar que nossas ações foram erradas ou equivocadas, mas nos vemos como pessoas fundamentalmente más. No caso da culpa, a consciência da transgressão se limita a uma situação específica. A vergonha nos parece ser uma medida de quem somos. As pessoas que sentem vergonha sofrem. Pessoas envergonhadas se desaprovam e querem mudar, se esconder, ou livrar-se totalmente de si mesmas.
O arrependimento, por sua vez, nos ensina a como repetir falhas ou situações negativas no futuro. É um poderoso instrumento de ensino.
A dúvida nos faz refletir sobre nossa capacidade de tomar decisões. Tendemos a acertar mais quando temos dúvida. Quem nunca tem dúvida, e é muito senhor de si, tem uma tendência maior de refletir menos e errar mais.
Já o medo nos ajuda a ficar vivos e evitar perigos. Pessoas medrosas têm muito mais possibilidades de viver por mais tempo do que as pessoas destemidas. Se não existisse o medo, garanto a vocês que nenhum de nós estaria lendo esse texto hoje.
Até desistir pode ser bom, pois muitas vezes o excesso de perseverança e resiliência nos faz muito mais mal. É a resiliência crônica, quando tentamos muito mais do que deveríamos, em vez de desistir logo, quando os prejuízos ainda são pequenos e as chances de sucesso pequenas.
O nojo, por sua vez, evita que a gente coma alimentos estragados ou que possam nos fazer mal.
O tédio também pode ser uma ferramenta útil, com a função de nos fazer saber quando as interações sociais ou a rotina estão nos dando desejos que não estamos satisfazendo. O tédio pode ser um indicador importante de que você está fazendo más escolhas.
Até o pessimismo é útil de vez em quando, especialmente em relação aos “pessimistas defensivos”, aqueles que têm esperança no melhor, mas se prepara para o pior. Esses são os que conseguem navegar melhor pela vida, sem a ingenuidade do otimista “Poliana”, nem o ranço do pessimista inveterado.
Tudo o que vimos até agora nos leva a um novo conceito, que é o de se buscar a Agilidade emocional e a “Inteireza” em vez perseguir a felicidade e as emoções positivas. É o entendimento de que todas as emoções têm utilidade, não existindo um tipo de emoção melhor do que a outra. O que existe é o cuidado em evitar o excesso, seja nas emoções positivas, seja nas negativas. As situações sempre serão diferentes. Precisamos saber nos adaptar a elas sem fórmulas rígidas.
Vários sentimentos tidos como negativos, como desânimo, culpa, tristeza, e frustração são feitos para que economizemos nossa energia e evitar investir em causas perdidas. Temos que ter flexibilidade para investir nossa energia quando as possibilidades são positivas, mas também de desistir quando o fracasso é mais provável.
A grande maioria das pessoas é emocionalmente ágil e flexível, adaptando-se às situações, sendo gentil e pressionando um pouco os outros em interesse próprio. Elas se exibem, flertam, insinuam e ajudam os outros não só para ter algum ganho pessoal, mas para fazer as outras pessoas se sentirem bem e fortalecer relacionamentos.
Acredito que o grande objetivo de todos nós deve ser abraçar o conceito de busca da “inteireza” em vez da felicidade e ser emocionalmente ágil para com isso conseguir se adaptar e tirar proveito de cada situação, que nunca são permanentemente positivas ou negativas. Essas pessoas conseguem trocar a palavra emoção “negativa” por emoção “útil” e com isso ter uma vida muito mais plena.
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