O medo, a ansiedade e as preocupações em nossas vidas (e como enfrentá-las)
- Felipe Cavalcante
- 28 de jun. de 2021
- 10 min de leitura
“Parte de ser humano é administrar o equilíbrio entre antecipar o futuro e aceitar sua incerteza. Preocupação é um sinal de que o equilíbrio foi perturbado. ”—Susan M. Orsillo e Lizabeth Roemer,
Eu tenho uma fixação em aprender como lidar com preocupações e ansiedade. Depois de ter passado por uma série de situações difíceis, com boa parte dos empresários brasileiros, eu comecei a refletir e estudar como podemos reagir melhor aos problemas que a vida joga no nosso colo.
Eu percebi que existem muitos estudos científicos e técnicas de como lidar com essas situações, mas que as pessoas não têm acesso a elas. Também prejudica o fato de que esse tipo de assunto é geralmente tratado de maneira superficial e apelativa, fazendo com que se torne domínio das leituras e cursos de autoajuda.
As pessoas que possuem muitas preocupações e crises de ansiedade também procuram psicólogos e fazem terapia. O problema é que, salvo algumas exceções como a Terapia Cognitivo Comportamental e a Terapia de crises, a maior parte das terapias não têm instrumentos para as pessoas lidarem com essas situações e focam muito em encontrar culpados no passado e em uma autoanálise das pessoas. Ou seja, as terapias não dão instrumentos práticos e orientações sobre como as pessoas devem lidar com os problemas que enfrentam.
Mas para ir em frente, a primeiras coisas a entender é a diferença entre medo, ansiedade e preocupação. O medo acontece quando estamos na presença de algo que nos assusta. Já a ansiedade tem a ver com uma ameaça imaginada que pode ou não se tornar realidade. Já a preocupação é um tipo de ansiedade na qual nos preocupamos reiteradamente sobre algum pensamento que tememos e que envolvem incertezas.
Dando um exemplo, eu me preocupo por meu filho adolescente sair de noite com os amigos, fico ansioso quando ele sai e com medo quando ele não atende o telefone ou quando recebo uma ligação de madrugada em uma noite em que ele saiu.
Dito isso, vou me aprofundar um pouco mais na ansiedade, essa praga dos dias modernos. Como tudo na vida, incluindo remédios, o ponto central não é ter ou não ansiedade, mas em qual dosagem tê-la. Do mesmo jeito que ansiedade demais não é bom, ansiedade de menos também não é.
Como a maioria das emoções tidas como negativas, a ansiedade existe por uma razão, e essa razão é fazer a gente prestar atenção em possíveis ameaças e tomar as medidas necessárias para enfrenta-las. Ou seja, quando estamos ansiosos, focamos na ameaça.
O problema é que se ficarmos ansiosos demais isso nos deixará disfuncionais, deixando aquela ansiedade tomar conta de nossa vida. Por outro lado, se ficarmos ansiosos de menos e deixar a ameaça para lá, sem prestar a devida atenção e sem gastar a energia necessária que a situação exige, o problema pode não só se concretizar, com até escalar e tomar maiores proporções. Assim, precisamos da quantidade certa de ansiedade para tomar as melhores decisões e aumentar nossas possibilidades de sucesso não só em uma situação pontual, mas na vida com um todo.
Dentre os vários tipos de ansiedade, um deles tem se alastrado cada vez mais. É a ansiedade social. Ela acontece especialmente em situações em que estamos nos apresentando ou sendo avaliados, como dar palestras, ir a uma festa, conhecer novas pessoas e discordar de alguém.
O ponto central é que nesse tipo de situação as pessoas ficam com receio de fazerem algo vergonhoso ou de as pessoas fazerem uma avaliação negativa dela. E o que mais alimenta a ansiedade social é o fato de que realmente é difícil a pessoa saber se esses medos são fundados ou infundados, pois fora as situações onde somos um retumbante sucesso ou fracasso, na maioria das situações não sabemos o que as pessoas pensaram do nosso discurso ou de nós. Não há um critério objetivo e nem feedbacks estruturados.
Outra situação muito comum é ficarmos ansiosos com receito da ansiedade. Seria engraçado se não fosse triste, mas todos nós sabemos que essa ansiedade existe. Nós temos medo da própria ansiedade, o que só leva a ficar ainda mais ansiosos.
Já o medo também pode ser sutil ou debilitante. Quando estamos com medo toda nossa atenção é drenada por ele, sendo muito difícil pensar ou focar em outra coisa, tendo em vista que nosso sistema nervoso entra em alerta máximo e nosso corpo se prepara para agir baseado no modelo clássico de “lutar” ou “fugir”.
Por mais que o medo também tenha uma função válida, que é nos manter seguro, ele também pode se tornar disfuncional e prejudicar nossas vidas. De um lado, as chances de uma pessoa sem medo, (excessivamente corajosa ou inconsequente) se machucar e até de morrer são bem maiores do que as de uma pessoa “medrosa”. Apesar de muito glamourizados, os heróis destemidos têm muito menos chances de sobreviver às batalhas reais ou da vida do que o covarde.
Por outro lado, a pessoa excessivamente medrosa dificilmente alcançará sucesso na vida, pois não está disposta a enfrentar os desafios que a vida nos impõem. Assim, é muito comum que as pessoas acabem evitando as situações que possam gerar medo, fazendo com que elas vivam uma vida cinzenta e limitada. E o pior é que mesmo que as pessoas tenham consciência de que seus medos podem ser exagerados, isso não faz com que seja mais fácil se livrar deles.
E aqui não estamos falando necessariamente de grandes medos, daquele tipo que ameaça as nossas vidas, mas de uma enorme variedade de medos que nos afligem no dia-a-dia, como medo de voar, de altura, de cobras e até de tomar injeção, entre outros incontáveis.
Outro cuidado que você deve ter é de não tomar decisões baseadas no medo, especialmente quando eles são rotineiros e até imperceptíveis, podendo causar grandes impactos em sua vida e impedindo você de viver sua vida em plenitude.
Existem muitos desses tipos de medos, consistentes e que fazem parte de nossas vidas.
O medo de nos envolver com alguém e nos apaixonar devido a alguma experiência negativa anterior é um deles. O medo do fracasso, deixando de tomar atitudes e assumir riscos é outro. Por incrível que pareça, existe também o seu oposto, o medo do sucesso. O medo de magoar pessoas que estão nos puxando para baixo, mesmo que sejam pais e conjugues. O medo de desapontar. O medo de ser quem você realmente é obrigando-o a viver como as pessoas esperam e não como você quer. O medo do desconhecido. Em resumo, existem uma infinidade de medos, além dos físicos, que nos impelem a viver uma vida miserável ou muito aquém do seu potencial.
Outra curiosidade minha era saber como essas emoções funcionam dentro do nosso cérebro e do organismo. Grosso modo, é mais ou menos assim.
Quando a gente vê um cachorro vindo em nossa direção, essa informação é enviada para a Amígdala, que é a parte do cérebro responsável por expressar medo e outras emoções. Mas existem cachorros que representam perigo e outros com os quais não precisamos nos preocupar. Quem ajudar a colocar essa situação em contexto é o hipocampo, outra parte do nosso cérebro.
Se o cachorro estiver vindo em sua direção latindo agressivamente e salivando, a Amígdala irá enviar essa informação para o Hipotálamo, que ativará a reação de luta ou fuga liberando os hormônios do estresse, como a adrenalina. Ele também aciona a glândula pituitária que viaja pela corrente sanguínea até as glândulas suprarrenais, fazendo com que elas liberem mais hormônios de estresse como o cortisol. No final das contas, muito da nossa sobrevivência se deve ao correto funcionamento desse mecanismo.
Tendo entendido como as coisas funcionam em nosso cérebro, vamos ver como podemos reagir melhor às nossas preocupações, ansiedades e medos, ok?
Para isso é importante ter consciência de que tudo passa pelos nossos pensamentos. Quando estamos com receio de algo é normal que essa situação cresça e chegue a dominar os nossos pensamentos. Precisamos interromper essa escalada e desafiar esses pensamentos, até porque quando estamos muito ansiosos dificilmente conseguimos nos acalmar com a razão.
Essas são algumas técnicas que podem ser utilizadas para lidar com nossos pensamentos:
Lembre-se de que a ansiedade não é perigosa.
Temos tanto medo da ansiedade que esquecemos que ela não é prejudicial. O que quero dizer é que a ansiedade dificilmente representará um perigo real seja física ou emocionalmente.
Reavaliar a probabilidade do perigo
Na maioria das vezes ficamos convencidos de que o nosso medo vai realmente acontecer. Por isso precisamos ter a consciência de que muitos dos nossos medos são irreais em relação aos seus riscos verdadeiros. Geralmente a probabilidade de eles acontecerem são muito mais baixas do que receamos. É preciso se perguntar se as evidências são realmente fortes, se existe alguma evidência contrária, se isso já aconteceu antes e se sim, com que frequência. Após se fazer essas perguntas, reavalie a situação com base nessas informações.
Reavaliar a gravidade da ameaça
Outras vezes o pensamento negativo não tem nada a ver com a probabilidade de algo acontecer, mas o quanto seria ruim. Ficamos imaginando que as coisas serão muito piores do que realmente são.
Por que se preocupar?
Existem várias razões que podemos elencar para ficarmos preocupados e que podemos utilizar como justificativa, pois nós acreditamos que se preocupar é sinal de responsabilidade, que nos ajuda a encontrar soluções para os problemas, nos faz antever eventuais surpresas, demonstra que nos preocupamos com algo, que aumenta as chances de algo dar certo. Algumas vezes isso pode até estar certo, mas na maioria das vezes é falso.
Testar suas previsões
É extremamente frequente nos preocuparmos com algo que acaba não acontecendo. Na verdade, a grande maioria das coisas com as quais nos preocupamos acabam não acontecendo e é importante lembrar sempre disso em momentos de crise. Existem estudo que mostram que 90% das coisas com que nos preocupamos não acontecem e se acontecem nós lidamos com elas de maneira muito melhor do que imaginávamos a princípio.
Uma coisa que eu faço é anotar o meu medo e verificar uma semana ou um determinado tempo depois como as coisas se desenrolaram. Não tem erro. Quase sempre as coisas não acontecem como eu temia. Além disso, é igualmente importante registrar quando nossas previsões se mostram falsas para nos ajudar a ir consolidando essa percepção e nos preparar melhor para situações similares no futuro.
Tendo aprendido a compreender e lidar melhor com nossos pensamentos, é hora de colocar mãos à obra e agir em relação aos nossos comportamentos. E para isso não existe técnica melhor do encarar de frente o problema.
Enfrentar nossos medos diretamente é o que se chama de “terapia de exposição” e é o antídoto para as situações que nos mantém ansiosos.
A exposição ao que nos causa ansiedade funciona porque permite que nosso sistema nervoso aprenda como o perigo é geralmente exagerado, nos dá confiança para enfrentar nossos medos e reforça a percepção de que a ansiedade não é em si perigosa. Não existe arma mais poderosa para acabar com o excesso de ansiedade do que a exposição ao que a gera.
Um exemplo é o medo de baratas. O primeiro passo hipotético para superá-lo seria a pessoa ficar em uma sala ao lado de um local que tem um baú de vidros repleto de baratas e de onde se pode vê-las. Um segundo passo poderia ser entrar na sala onde está o baú de baratas. A seguir a pessoa poderia ficar ao lado do baú. O próximo passo poderia ser a pessoa pegar uma barata. E finalmente o texto final seria a pessoa colocar a mão dentro do baú de baratas.
Mas claro que a exposição eficaz tem toda uma técnica por trás. Alguns dos princípios são esses:
· Ser intencional: precisa ser uma atitude deliberada.
· Ser progressiva: comece com coisas mais fáceis e passe gradativamente às mais difíceis.
· Ser prolongada: Precisa durar algum tempo.
· Repetitiva: É a reincidência do ato que vai fazer você dominar o seu medo.
Outra estratégia é evitar comportamentos de segurança, que são aqueles que incorporamos quando queremos evitar que algo que tememos aconteça. Um exemplo é que devido ao medo de esquecer algo durante um discurso ou palestra, a pessoa lê o texto por escrito, prejudicando ainda mais a percepção do público sobre ele.
Há dois problemas principais com comportamentos de segurança. Primeiro, nos ensinam que, se não fosse o comportamento de segurança, as coisas teriam saído muito mal, perpetuando, assim, os comportamentos e nossos medos. Segundo, podem acabar prejudicando nosso desempenho, como quando um palestrante capaz não para de olhar suas notas, o que o impede de envolver-se com a plateia.
Outra maneira de controlar a ansiedade é através da respiração. Eu sempre repito que o uso adequado da respiração para lidar com momentos de estresse deveria ser ensinado na escola de tão importante que é. Infelizmente, eu só descobri sua importância há alguns anos.
Sempre que ficamos nervosos, respiramos rápida e superficialmente, com a respiração se concentrando no tórax. A maneira correta é respirar lenta e profundamente, concentrando-a no abdome, embaixo do umbigo, deixando a barriga inflar e desinflar. É importante expirar ainda mais lentamente do que inspirar. É fundamental você se lembrar disso sempre que ficar ansioso e praticar. Com o tempo a prática da respiração consciente vai ficar mais e mais natural.
Focar no presente também outra técnica básica para lidar com a ansiedade e a preocupação. O ser humano vive no passado e no futuro. Quando se arrepende do passado e se preocupada com o futuro ele está sendo infeliz. A ansiedade está sempre nos levando a focar no futuro. Precisamos combater conscientemente isso. A melhor maneira de fazer isso é através dos sentidos, olhando ou sentindo o que está ao nosso redor.
Eu gosto muito de ficar olhando com atenção para os objetos do local onde estou. Se estou andando a pé ou de carro faço a mesma coisa, notando os detalhes que de outra maneira eu não prestaria atenção. Ao tomar banho, quando as idéias pipocam na cabeça, eu passo a sentir os pingos de água. Na cama, com a cabeça a mil, passo a sentir o ar e os lençóis em minha pele e foco a atenção no barulho do ar condicionado. O objetivo disso tudo não é afastar a ansiedade, mas trazer sua cabeça de volta quando ela se voltar das suas preocupações.
Mas nada é melhor do que gastar seu tempo com trabalho, vendo televisão, lendo ou ouvindo música. Esse é o melhor tipo de “meditação” para lhe fazer ficar no momento presente. Por isso que muita gente adora desligar vendo televisão, porque não fica pensando nos problemas. Eu, particularmente, adoro ler, mas acho que a melhor maneira é ouvindo música porque além de fazer a gente esquecer das coisas ainda nos faz ficar feliz.
Outro segredo para lidar com nossos medos é aceitar que eles podem acontecer. Simples assim. Eu chamo essa técnica de “E daí? ”. E daí se acontecer? É infalível para mim.
Ficamos sofrendo com receio do que pode acontecer, mas precisamos entender que nem sempre podemos controlar os resultados das coisas. Muitas delas acontecerão e precisamos aceitar esse fato. Um bom exercício e começar a dar mais importância ao que podemos controlar e não valorizar tanto o que não está sob nosso controle. Isso faz com que relaxemos e fiquemos menos ansiosos e preocupados sobre o que o futuro nos traz.
Parte desse processo inclui aceitar que a única certeza que temos é a incerteza. Aceitá-la é parte importante de nos tornarmos menos ansiosos. Precisamos aprender a lidar melhor com ela se queremos ter uma vida mais tranquila.
Essas são algumas das ferramentas que podem ser utilizadas para enfrentar nossos medos, preocupações e ansiedades. Talvez você não consiga utilizá-las todas, mas é importante começar a aumentar o seu arsenal. Está ao seu alcance. Muitas pessoas já se beneficiaram delas e você pode ser a próxima. Sucesso!
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