Desde que comecei a ter interesse em urbanismo e bairros planejados, lá pelos idos de 2005, me encantei com a palavra Placemaking. Sempre achei o máximo a capacidade de criar lugares. E saber que existiam técnicas para isso explodiu a minha mente.
Tomei contato com o termo e a ciência do Placemaking, e também com Novo urbanismo, através do livro Placemaking do Chuck Bohl. A mesma coisa aconteceu com o Valério Gomes, o visionário fundador da Cidade Pedra Branca, o bem-sucedido bairro planejado de Palhoça/SC baseado no Novo urbanismo.
Acabei entrando em contato com o Chuck e passamos a ter contato. Inicialmente, convidei ele para participar do NORDESTE INVEST 2009 em Natal, onde, pela primeira vez, a ciência do Placemaking foi abordada no Brasil.
Posteriormente, ele organizou para a ADIT dois cursos na Universidade de Miami, onde ele é o Diretor do curso de arquitetura, e que contou com a participação de alguns dos maiores nomes do Novo urbanismo, como os seus fundadores Andres Duany e Elizabeth Plater-Zybeck.
Eu e ele tentamos traduzir o seu livro para o Brasil, mas a editora do ULI (Urban Land Institute) não demonstrou interesse. Uma pena.
Desde então, porém, o termo Placemaking começou a ser difundido no Brasil. Muito em função das palestras, webinars, artigos e cursos que realizamos pela ADIT, além de outras pessoas que foram tomando contato com o Placemaking via outros canais.
Mas para falar de Placemaking é importante contar um pouco da sua história. As raízes dele remontam à Jane Jacobs (sempre ela), muito em função de sua defesa da participação da comunidade no planejamento urbano, em oposição ao planejamento Top down então vigente. Apesar de ela não ter qualquer envolvimento com o movimento de Placemaking, certamente foi uma fonte de inspiração.
O Placemaking começou a tomar forma através da atuação de William (Holly) Whyte, um estudioso da vida urbana e de suas dinâmicas. Foi um assistente dele, Fred Kent, quem fundou a PPS – Project for Public Spaces, entidade responsável pela disseminação do conceito de Placemaking nos EUA e no mundo.
Mas, apesar de estar começando a ficar mais conhecido no Brasil, o termo Placemaking ainda precisa ter seu significado mais esclarecido. A definição mais aceita é a de que Placemaking é processo de criar lugares de qualidade nos quais as pessoas querem viver, trabalhar, brincar e aprender.
Porém, acho que cabem vários adendos à essa definição. O primeiro é que ele é um processo colaborativo, que precisa ter o envolvimento das pessoas que fazem parte daquela comunidade.
Outro ponto importante é uma das principais tarefas do Placemaking é criar conexões emocionais entre as pessoas e o lugar, além de criar conexões entre as pessoas daquela comunidade. Isso não pode ser subestimado, pois não existe criação de lugar sem colocar as pessoas em contato umas com as outras.
Ao criar emoções e sentimentos nas pessoas em relação a um lugar, geramos o tão famoso Senso de pertencimento, uma sensação onde a pessoa sente que pertence àquele lugar e que a faz se “sentir em casa” nele.
Ao criar um lugar que se torna o coração de uma comunidade, conectado às pessoas, onde as pessoas se conectam entre si e que gera Senso de pertencimento, conseguimos construir o almejado Senso de comunidade.
Em resumo, um lugar é um local sobre o qual as pessoas atribuem um significado e com o qual possuem uma conexão emocional, indo muito além de sua localização ou atributos físicos. É uma mistura de sua forma física com as atividades que acontecem ali, gerando uma sensação de apego ao local.
Alguns atributos importantes na criação de um bom lugar:
· São acessíveis e bem conectados a outros lugares importantes da região.
· São confortáveis e projetam uma boa imagem.
· Eles atraem pessoas para participar de atividades lá.
· São ambientes sociáveis em que as pessoas querem se reunir e visitar de novo e de novo.
Apesar de se falar muito que os lugares são ambientes sociáveis e que só existem se houverem pessoas nele, existem muitos lugares que têm significado pessoal para algumas pessoas. Eu, por exemplo, tenho uma parte da praia de Ponta Verde em Maceió que tem grande significado para mim pois é aonde eu sempre vou com a minha mãe, enquanto outro lugar na praia de Barra de São Miguel é onde sempre vou com meu filho. São lugares especiais para mim, com os quais tenho ligação emocional e memória afetiva. Já minha esposa, tinha um lugar em nosso resort onde colocou uma santa da qual é devota e onde sempre ia rezar. Era um lugar especial para ela.
Apesar disso, sabemos que o que atrai pessoas são pessoas, sendo crucial que incentivemos o uso do lugar pelas pessoas, já que deixa-lo vazio vai torná-lo pouco atrativo para que as pessoas o frequentem. É preciso ter vida em um local para ele se tornar um lugar.
Um ponto que também deve ser observado em um lugar é que ele precisa ter uma identidade própria. Seja por suas características físicas ou pelas atividades que acontecem nele, ele precisa ser único, ter personalidade.
O oposto a isso são os Não-lugar, locais como aeroportos, shopping centers e hotéis de redes que não possuem personalidade própria e ao estar em um, você poderia estar em qualquer um. Muitas praças são tão genéricas e pouco atrativas que acabam se tornando não-lugares também.
Outro aspecto fundamental da criação de um lugar é a sua diversidade de público-alvo, tipos de uso e horários de uso. Eles têm que ser usados por pessoas diferentes com propósitos diferentes em horas diferentes em dias diferentes. Por isso, que o uso misto ao redor de um lugar é fundamental para o seu sucesso. Lugares que possuem, por exemplo, apenas casas unifamiliares ao seu redor, vão ser utilizados apenas em determinados horários e dias da semana por pessoas com perfis muito similares. Claro que ainda assim ele é um lugar, mas com muito menos uso e vida do que poderia ter.
Já a criação de comunidades é um processo de conectar pessoas que possuam uma motivação ou interesse em comum e fazer com que se conectem com frequência, compartilhando valores e experiências.
Por isso que a interação social é a base de uma comunidade. Simplesmente não dá para criar uma comunidade sem colocar as pessoas em contato umas com as outras e sem envolvê-las não só nas atividades, mas também das decisões relativas ao lugar e à própria comunidade. Por isso, que ela sempre é tida como uma atividade Bottom up, ou seja, de baixo para cima.
Isso nos traz para outro ponto crucial: a comunidade não tem dono. Pode até haver indução e organização inicial por parte do Poder Público ou do empreendedor, mas tudo deve ser feito para que com o passar do tempo esse bastão vá sendo passado para a comunidade, o que inclui a definição das atividades a serem realizadas e sua viabilização.
Mas não se esqueça que uma comunidade é rica em pessoas e situações e que entre elas sempre existirão conflitos a mediar e personalidades difíceis com quem lidar. Se você quer entrar no negócio de criar comunidades, avalie antes se você tem o perfil, vocação e estômago para tratar com todo o lado negativo que acompanha a criação de lugares mágicos e comunidades dinâmicas e atrativas.
Em resumo, para ser um Placemaker você precisa gostar de pessoas, com tudo de bom e de ruim que isso significa. Se você for esse tipo de pessoa lhe garanto que terá uma jornada muito gratificante. Criar lugares e comunidades é uma dádiva que traz senso de propósito e pode lhe ajudar a deixar um legado. Se isso lhe interessa e lhe motiva, bem-vindo ao Placemaking!.
Autor: Felipe Cavalcante
Contato: felipe@matx.com.br
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